No dia 3 de maio de 1902, não sei mais em que incumbência da minha engenharia ingrata, eu seguia, a cavalo, da Vila de Redenção para S. Luís do Paraitinga. Ia escoteiro e rápido, apertando nas esporas o burro ronceiro num meio galope troteado e duro, enquanto, retardado, o camarada, um esplêndido companheiro, o Quincas Ruivo, forceja por avançar do mesmo, rápido, mas sem perder de vistas os sucessivos desvios ou erradas, recortando a estrada e pelas quais, às mais das vezes, eu desastradamente entrava.
“Seu doutor é pra direita…”
“Toque à esquerda, patrão!”
E lá íamos. Conforme um hábito antigo, mercê do qual as maiores distâncias desaparecem-me em horas, que me parecem cinco minutos, eu me entregava à contemplação tenaz dos mínimos incidentes das paisagens, ora numa análise miúda, destacando um a um os mínimos pormenores; ora inteiramente deslumbrado, no galgar um outeiro pelo conjunto da terra […]
CUNHA, Euclides da. As santas cruzes. In: EUCLIDESITE. Obras de Euclides da Cunha. Dispersos e fragmentos. São Paulo, 2021. Disponível em: Acesso em: [data]. Reprod. As santas cruzes (Manuscrito do talonário da Superintendência de Obras Públicas de São Paulo, c. 1902). In: CUNHA, Euclides da. Obra completa. Fragmentos e relíquias. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2009. v. 1. p. 825. Cotejado posteriormente com: CUNHA, Euclides da. Ensaios e inéditos. Coord. Leopoldo M. Bernucci, Francisco Foot Hardman, org. estabel. de texto, prefácio e notas por Leopoldo M. Bernucci, Felipe Pereira Rissato. São Paulo: Editora UNESP, 2018. p. 83-4. Acervo do Grêmio Euclides da Cunha. Publicado originalmente na Revista do Grêmio Euclides da Cunha, Rio de Janeiro, 15 ago. 1917, p. 6-7.
Ver também Numa volta do passado