Aconteceu em agosto: casos e causos das Semanas Euclidianas
Semana Euclidiana é para acontecer de tudo um pouco, porém, às vezes, acontece de tudo em grande quantidade.
A ideia era um filme contando diversas passagens da vida de Euclides da Cunha, seu trabalho, seus pensamentos, seus ideais e, em São José do Rio Pardo, o período da reconstrução da ponte e da confecção de parte do livro Os sertões.
Já citei diversas vezes a dedicação do povo riopardense com as coisas ligadas a sua cultura e principalmente à Semana Euclidiana e desta vez não foi diferente. Tudo o que dizia respeito ao cinema, a população estava prestes a colaborar, desde pequenos detalhes como arrumar um par de sapatos a uma figurante até emprestar búfalos brancos para uma cena que causou grande furor na cidade e quase derrubou a ponte metálica.
A licença poética é um direito incontestável do artista e, sendo o diretor da película um artista nato, lá estava a imaginação a serviço da arte.
A cidade estava enlouquecida, pois havia atividades da Semana Euclidiana como: jogos, shows, palestras, debates, ciclo de estudos e a filmagem. Ah! A filmagem!
Aquela semana vai ficar na história como uma das semanas mais agitadas e merece mesmo uma coletânea específica.
O diretor do filme, cineasta experiente e apaixonado pela obra de Euclides e por São José do Rio Pardo, tratou de convocar a todos para participarem do filme, direta ou indiretamente. Sua equipe era composta por um pequeno grupo de atores profissionais e técnicos, os demais foram recrutados na cidade, até os maratonistas entraram nessa.
A rádio local assediando atores; o diretor para entrevistas e notícias sobre as filmagens; todos se colocando à disposição para o que fosse necessário para a realização da obra, lembrando-se de que o cinema nacional passava pelo mais completo desrespeito e descaso e, realmente, naquela altura, aventurar-se em um tema como o que estava sendo proposto, era preciso coragem e muita ousadia.
Dentro da licença poética do cineasta havia uma cena que se passava à noite, tratava-se de uma mulher nua sobre um búfalo branco que atravessava a ponte metálica sobre o rio, algo sui generis. Búfalo branco! Caracas! Deixou de ser licença poética e passou a ser viagem… Onde arranjar um “troço” desses? Perguntava a maioria.
O diretor, muito esperto, foi à rádio local e acertou uma entrevista num dos programas de grande audiência na cidade e região; relatou o plano da filmagem da mulher nua sobre o búfalo branco, porém a dificuldade não era convencer a atriz principal a despir as roupas, mas arrumar um búfalo branco. Pronto! Foi o mesmo que oferecer horta para bode tomar conta…
No dia seguinte, na porta da Casa Euclidiana, transformando o trânsito da Rua Marechal Floriano em quase que trânsito de marginal paulistana em dia de enchente, misturado com Avenida Paulista em dias de festa ou passeatas, cinco búfalos brancos com seus proprietários e ajudantes efusivamente se oferecendo para colaborar com o cinema nacional. Ao sair à janela, a responsável pela instituição, uma das poucas mulheres que podem ser chamadas de ladies neste país, sem saber do acontecia exclamou:
– Essa Semana Euclidiana virou uma sucursal do inferno!