Clima

Não podíamos obter elementos que estabelecessem, mesmo palidamente, as características do clima local do Alto Purus, destacando-o no quadro geral da climatologia amazônica. Observamos em condições de todo desfavoráveis – num tempo muito curto e numa mobilidade constante quando as deduções meteorológicas exigem precisamente circunstâncias opostas.

 

Os escassos dados obtidos mal nos permitem algumas conclusões gerais.

Assim, quanto à temperatura notamo-la em contínuo decrescer claramente explicável pelas influências combinadas das altitudes e latitudes crescentes. Mas não podemos defini-la em números precisos, sendo evidentemente inexpressivos e falhos os quadros que apresentamos apenas para que se destaquem alguns casos anômalos observados.

É o que sucede, por exemplo: com a friagem, tão própria destes climas e de causas ainda hoje controvertidas.

Suportamo-la por duas vezes e em ambas o mesmo cortejo de fenômenos nos inclina às opiniões dos que a relacionam de qualquer modo com uma influência remota da atmosfera frigidíssima que envolve as cumeadas dos Andes, e se desloca às vezes para as regiões de N e NE já em virtude de repentinas mínimas barométricas nelas operadas, já em virtude da ação dos ventos do SW que se figuram os reguladores preponderantes do clima em tais paragens.

Como quer que seja, foi no dia 13 de Agosto, às seis horas da manhã, na confluência Cujar-Curiúja que observamos a temperatura rara de 11,8° C. de todo anômala em semelhante latitude.
 

Dous dias antes, a 11, o calor crescera continuamente, de 18° C pela manhã a 28,8 a 1h p. m. permanecendo nesta altura até às cinco da tarde, em que repentinamente caiu para 23,2 C, às 6 p.m., ao mesmo tempo que uma depressão barométrica de 0,004m prenunciava grande mudança de tempo.

De fato, no dia 12 (em que se manifestaram desde cedo grandes aguaceiros sulcados de impetuosas rajadas) a temperatura, atingindo a um maximum de 21°,8 c. às 10h a.m., caiu às 16° C ao meio dia, e foi insensivelmente diminuindo até às 6h da manhã de 13, em que se observou o grau térmico talvez nunca registrado em semelhante zona, 11,8° C.
Releva notar que a partir dele começou a melhorar o tempo, cessando totalmente as chuvas de sorte que ao meio dia, estando os céus inteiramente claros, notamos a temperatura de 24,5°. A pressão era de 754 m, o maior de 0,0028 m que a da hora homóloga da véspera, 751,2.

 

Num quadro anexo [Quadro 2 ] apresentamos, pormenorizadamente, as principais observações realizadas do dia 11 ao dia 14, relativas àquele fato.

Das observações regulares com os aneróides, resulta que as marés atmosféricas, da foz do Chandless para cima se realizam com as máximas às 9 e 30 A e P.M., e as mínimas às 3 e 3 A. e P.M.

Graças ao influxo moderador das vastíssimas florestas que cobrem totalmente a região, o clima tem quase que a fixidez de um regímen marítimo sem as variações de grandes amplitudes dos climas continentais. Mesmo por ocasião da fortíssima crise térmica da friagem, vimo-lo há pouco, não se registra uma diferença de 15° em 24 horas.

A umidade é, como em toda a bacia amazônica, excessiva. Pela manhã até às 8 horas, quase invariavelmente, uma forte condensação encobre os objetos a poucos passos de distância, e desde que anoitece a exposição fora das barracas é bastante para que se molhem as vestes e todos os objetos mal resguardados. Esta copiosa precipitação de orvalho realiza-se muitas vezes sem que nenhuma aparência a revele. As observações, à noite, realizavam-se não raro facilmente, ante a transparência perfeita dos ares e o brilho nítido das estrelas. Entretanto de momento em momento fazia-se mister enxugar os vidros das lunetas, e ao fim de uma hora volvíamos às barracas com as vestes quase gotejantes.

 

Completamos estas informações com as seguintes prestadas pelo Sr. Dr. Thomaz Catunda, médico da Comissão Brasileira.

Extracto do Relatório do médico da Comissão Brasileira de Reconhecimento do Alto Purus

“O bom êxito da nossa expedição ao Purus, sob o ponto de vista sanitário é prova de que aquela região é perfeitamente habitável, bastando para isto a observância de regras muito comezinhas de higiene tropical. – Nem outra coisa fizemos nós, não tendo entretanto a Comissão, composta de 42 pessoas, a partir da Boca do Acre, nenhuma perda de vida à lamentar. E parte dela de Abril a Outubro, viajou constantemente rio acima e rio abaixo.

[…]
“Devemos ponderar que, sendo o grau térmico e higrométrico muito favoráveis ao desenvolvimento da micro-fauna e da micro-flora os germens patógenos encontram ali o seu optimum de prosperidade, podendo provocar com facilidade epidemias mais ou menos graves. Paralelamente criam-se e multiplicam-se os insetos parasitários, hoje increpados de propagação de certo grupo de moléstias infecciosas. Há farto pábulo nas fermentações para todos os pequenos seres.
As infecções são por lá tanto mais de temer quanto os germens patógenos surpreendem muita vez um estado minoris resistentiœ nos organismos combalidos por má alimentação, por exaustão de forças, por afrouxamento nervoso, por míngua ou supressão das funções secretoras e excretoras, etc. Em tais condições os que vingam penetrar na corrente circulatória, pululam fabulosamente e… ganham a partida.

Na região compreendida entre S. Brás e Sobral, onde melhores pesquisas me foi possível fazer, não encontrei nenhuma espécie de anófeles. Também não achei casos autóctones de impaludismo; os poucos que se me depararam, provinham do interior ou de outros pontos.

Releva considerar que à conta de impaludismo se enxertam numerosos casos de tifismo e de pseudo-tifismo. Colhi algumas vezes esplêndido resultado em casos de febre intermitentes, que se atribuíam ao impaludismo, unicamente com a aplicação de purgativos, antissepsia intestinal e modificação do regímen alimentício.

Antes da nossa partida dei algumas instruções escritas a respeito das normas a observar, insistindo mui particularmente sobre o uso de meios de proteção mecânica contra os carapanã (telas, mosquiteiros), a administração sistemática dos sais de quinino a variedade do regímen alimentício, moderação do trabalho, ainda mais nas horas de maior calor, e supressão completa de bebidas alcoólicas.

Também insisti porque fossem maiores de 18 anos todos os indivíduos que deveriam compor a nossa expedição, visto serem os menores dessa idade mais frequentemente vitimados nas zonas endemo-epidêmicas.

Nem sempre foram mantidas com o devido escrúpulo as minhas prescrições higiênicas, mas logo aos desvios dessa ordem seguia-se alguma manifestação mórbida, aviso natural ou punição da imprudência. Os casos patológicos de maior gravidade na Comissão foram devidos ao uso do álcool e ao excesso do trabalho. O álcool irritando a mucosa gástrica, congestionando as vísceras e mais acentuadamente o fígado, e deprimindo o sistema nervoso, o esforço material prolongado amofinando o tonus muscular e acumulando na economia toxinas que se deveriam ir eliminando à medida de sua produção, entibiam a resistência orgânica e franqueiam, afinal, entrada aos germens parasitários de auto ou de hetero-infecção.

Com o contingente e com a tripulação da lancha Cunha Gomes foram alguns indivíduos atacados de moléstia contagiosa e outros impaludados, o que a inspeção médica logo revelou. Graças à prontidão com que foram medicados vimo-los em breve curados e afastados assim o perigo da propagação desses estados mórbidos por contágio ou por infecção.

 

Tive logo em começo da viagem quatro casos de pequena cirurgia (úlceras, abscessos) e vários de medicina (bronquites, boubas, gonorréias, febres terçã e quartã, impaludismo crônico, eczema e sarna). Múltiplos casos tive depois; eram quase todos, afortunadamente, de pouca importância: supressão de transpiração, manifestações reumáticas, gastroenterite, etc.

 

Muito frequentes são as dermatoses, particularmente de forma impetigenosa e eczematosa, talvez produzidas por seres parasitários microscópicos de que é riquíssima a água do rio.”


Clima

No podiamos obtener elementos que estableciésen, ni aún pálidamente, las características del clima local del Alto-Purus, destacándolo en el cuadro general de la climatologia amazónica.

Observámos en condiciones enteramente desvarorables, en un tiempo muy corto y en una movilidad constante, cuando las deducciones meteorológicas exigen precisamente circunstancias opuestas.

Los escasos datos obtenidos de tal numero, nos permiten algunas incompletas conclusiones.

Asi en cuanto á la temperatura, notamos um continuo decrecimiento, claramente explicable por las influencias combinadas de las alturas y latitudes crecientes. Mas no podemos definirlas en numeros precisos, siendo evidentemente inexpressivos ó incompletos los cuadros que presentamos, apenas para que se destaquen algunos casos anómalos observados.

Tal és lo que sucede, por ejemplo, con el rápido resfriamento tan proprio de estos climas, y cuyas causas hasta hoy son discutidas.

Soportámolos por dos veces, y en ambas las mismas manifestaciones nos inclinan á las opiniones que la relacionam de algun modo con una lejana influencia de la friisima atmósfera que circunda las cumbres de los Andes, la cual se desplaza á veces sobre las regiones de N y NE, yá en virtud de repentinas minimas barométricas que alli se realizan, yá en virtud de la accion de los vientos del S. W., que se supone son los preponderantes reguladores del clima en tales parajes.

Como quiera que ello sea, fué el dia 13 de Agosto, á las 6 horas de la mañana, en la confluencia del Cujar y Curiúja, que observamos la temperatura rara de 11,8° C, que és del todo anómala en semejante latitud.

Dos dias antes, el 11, el calor aumentaba continuamente de 18° C por la mañana, á 28,8°, á la 1h p. m., permaneciendo en esta altura hasta las 5h. de la tarde, en que repentinamente bajó á 23,2° á las 6h p. m., al mismo tiempo que una depresion barométrica de 0,004m presagiava grande mudanza de tiempo. En efecto, el dia 12 se desencadenáron desde temprano fuertes lluvias acompañadas de impetuoso viento; la temperatura que alcanzó un maximum de 21,8° á las 10h a.m. bajó hasta 16° C al medio dia y fué insensiblemente disminuyendo hasta las 6h de la mañana de 13, en que se observó un grado termicoque nunca talvez habia sido registrado en semejantes horas. Debemos anotar que á partir de esta oscilacion comenzó á mejorar el tiempo, cesando totalmente las lluvias, de suerte que al medio dia, estando los cielos enteramente claros, sin una nube, anotamos la temperatura de 24,5° C. La presion éra de 0,754m, mayor portanto de 0,0028m que la de hora análoga de la vispera 0.751,2m.

En un cuadro anexo presentamos pormenorisadamente las principales observaciones de los dias 11 al 14, relativos á aquél hecho.

De las observaciones regulares de las aneroides, resulta que las marcas atmosféricas de la boca del Chandless para arriba, se realizan en maximum 3h30 A y PM.

 

Gracias á la influencia moderadora de las vastisimas florestas que cubren totalmente la region, el clima tiene casi la firmesa de um régimen maritimo, sin las variaciones en grandes amplitudes de los climas continentales; asi ni aún en ocasion de la fuertisima crisis térmica en descenso, áque hemos hecho referencia, no se registró una diferencia de 15° C en 24 horas.

La humedad és como en toda la haga amozonica, excesiva. Por la mañana hasta las 8 horas, casi invariablemente, una espesa condensacion de vapores cubre los objetos á pocos pasos de distancia, y desde que anochece, la exposicion fuera de las barracas ó carpas és bastante para que se mojen los vestidos y todos los objetos mal resguardados. Esta copiosa precipitacion del rocio, efectúase muchas veces sin que ninguna aparencia la revele. Las observaciones de noche realizanse no pocas veces facilmente ante la transparencia perfecta del aire y el brillo nitido de las estrellas; y sin embargo, de momento en momento haciase menester secar los vidrios de los instrumentos y al cabo de una hora volviamos á las carpas com los vestidos en extremo humedecidos.

Completamos estas informaciones, con las siguientes, suministradas por el Sr. Doctor Catunda, medico de la Comisión Brasilera:

Extracto del Informe del medico de la Comisión Brasileira de Reconocimiento del Alto Purus

[…]
“El buén éxito de nuestra expedicion al Purus, – bajo el punto de vista sanitario, és prueba de que aquella región és perfectamente habitable, bastando para esto la observancia de reglas de hygiéne tropical, de fácil ejecución. Debido a este cuidado, no ha tenido la Comisión, compuesta de 42 personas à partir de la boca del Acre, ninguna pérdida de vida á lamentar. Y, parte de ella, de Abril á Octubre ha viajado constantemente, recorriendo tanto la parte baja como la alta del rio Purus.
[…]
“Debemos recordar que, siendo el grado térmico é higrométrico muy favorable al desarollo de la microfauna y de la microflóra, los gérmenes patogénicos encuéntran alli su optimum de prosperidad, pudiendo provocar con facilidad epidemias más ó menos graves. Conjuntamente se crian y se multiplican los insectos parasitarios, hoy reconocidos como médios de propagación de cierto grupo de enfermedades infecciosas, y en las fermentaciones encuentran grandes medios de desarrollo ésos pequeños séres.

Las infecciones son por allá tanto más de temer-se cuanto los gérmenes patagénicos sorprenden muchas veces un estado minoris resistentiœ en los organismos debilitados por la mala alimentacion, por agotamiento de fuerzas, por aflojamiento nervioso. – En tales condiciones los que logran penetrar en la corriente circulatória pululan fabulosamente y… ganan la partida.
En la región comprendida entre San Blás y Sobral, donde mejores pesquizas me fué posible hacer, no he encontrado ninguna especie de anopheles. Tampoco he encontrado casos autoctonos de paludismo: los pocos que se presentáron, provenian del interior o de otros puntos.
Conviene anotar que con el nombre de paludismo, se ofreciéron numerosos casos que éran tifismoy pseudo-tifismo. Obtiénese á veces espléndido resultado en casos de fiebres intermitentes, que se han atribuido al paludismo, únicamente con la aplicacion de purgativos, antisepsia intestinal y modificacion del régimen alimenticio.

Antes de nuestra partida he dado algunas instrucciones escritas respecto de las normas que se debian observar, insistiendo muy particularmente sobre el uso de médios de proteccion mecánica contra los mosquitos (télas y mosquiteros), la suministracion sistemática de las sales de quinino, la variedad del régimen alimenticio, moderacion del trabajo, principalmente en las horas de mayor calor, y supresion completa de bebidas alcoholicas.

Tambien he insistido por que fuesen mayor de 18 años todos los individuos que deberian componer nuestra expedición, porque son los menores de ésa edad los más frecuentemente victimados en las zonas endémo-epidémicas.

No siempre fueron mantenidas mis prescripciones higiénicas con el debido escrúpulo, y la falta de su cumplimiento dió lugar á manifestaciones mórbidas, aviso natural ó consecuencia de la imprudencia. Los casos patológicos de mayor gravidad en la Comisión, fuéron debidos al uso del alcohol y al exceso del trabajo. El alcohol, irritando la mucosa gástrica, congestionando las víceras y más acentuadamente el hígado, deprimiendo el sistema nervioso; el esfuerzo material prolongado, mortificando el tonus muscular y acumulando en la economia tósigos que se deberian ir eliminando á medida de su producción, entibian la resistencia orgánica y finalmente franquean entrada á los gérmenes parasitarios de auto ó de hetero-infeccion.

En el contingente y en la tripulacion de la lancha Cunha Gomes, fueren algunos individuos atacados de enfermedades contagiosas y otros de paludismo, que la inspecion médica pronto reconoció. Gracias á la prontitud con que fueron medicados, los hemos visto muy luego sanos, y alejado asi el peligro de la propagación de esos estados mórbidos por contagio ó por infeccion.

Al principio del viaje hubiéron cuatro casos de ligera cirurgia (ulceras y abcesos), y vários de medecina (bronquitis, bobones, gonorréas, febres terciária y cuarteária, paludismo crónico, eccema y sarna). Muchisimos casos presentáronse despues, éran casi todos afortunadamente, de poca importancia: supresion de transpiración, manifestaciones reumáticas, gastro-interitis, etc.

Muy frecuente son las dermatosis, particularmente de fórma impetigenosa y eccematosa, quizá producidas por séres parasitários microscópicos, que en grandes cantidades contiene el agua del rio.”

Como citar
BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Relatório da Comissão Mista Brasileiro-Peruana de Reconhecimento do Alto Purus. Texto e pesquisa de Euclides da Cunha, pesquisa, rev. e trad. espanhol de Pedro Alejandro Buenaño. In: EUCLIDESITE. Notas de Oswaldo Galotti e Juan C. P. de Andrade, org. Juan C. P. de Andrade. Obras de Euclides da Cunha. São Paulo, 2020. Disponível em: https://euclidesite.com.br/obras-de-euclides/relatorio-da-comissao-mista-brasileiro-peruana-de-reconhecimento-do-alto-purus/ Acesso em: [data]. Reprod. BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Relatório da Comissão Mista Brasileiro-Peruana de Reconhecimento do Alto Purus: notas complementares do comissário brasileiro (1904-1905). Texto e pesquisa de Euclides da Cunha, pesquisa, rev. e trad. espanhol de Pedro Alejandro Buenaño. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1906. 7, 88, 76 pp., 2 fls. de lâminas dobradas, 2 mapas dobrados. 25 cm. Exemplar da coleção Dr. Oswaldo Galotti, Acervo Casa de Cultura Euclides da Cunha, São José do Rio Pardo, São Paulo. Ortografia atualizada.