Com exceção da editio princeps da Imprensa Nacional, de 1906, publicada em vida pelo autor e aqui reproduzida, nenhuma apresenta o texto integral do Relatório.
O extinto Serviço de Documentação da SPVEA (Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia), atual SUDAM (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia), publicou, em 1960, sob o título O Rio Purus, parte do Relatório, excluindo:
1 – Carta geográfica das nascentes do Purus e dos Varadouros que as ligam com as do Madre de Dios e do Ucaiale.
2 – Carta do Rio Purus, levantada pelo engenheiro Euclides da Cunha e Capitão-de-corveta Pedro Buenaño.
3 – Mapa Seção de vários afluentes, perto de suas embocaduras.
4 – Navegação do Purus; lista dos trechos principais que devem ser melhorados, com as seções, localidades, distâncias, matrizes dos obstáculos, etc.
5 – Atas de instalação e encerramento dos trabalhos.
6 – Correspondência oficial do Relatório.
A Nova Aguilar, sob a direção de Afrânio Coutinho, publicou na Obra completa, em 1966, as mesmas “Notas complementares” e excluiu, além das cartas, atas, mapas e tabelas, as duas primeiras partes referentes à organização da expedição e instruções dos ministérios brasileiro e peruano. Justificou em nota Afrânio Coutinho:
Foram suprimidos, apenas, os primeiros parágrafos, relativos à organização e às instruções recebidas dos ministros (…), bem como as cartas geográficas, os desenhos topográficos, os quadros estatísticos e grande parte dos dados numéricos, que perderam sua atualidade e que nenhum interesse oferecem para o leigo.
(CUNHA 1995: v. 1, 753)
Os “primeiros parágrafos” tomaram, na edição de 1906, sete páginas. Essas primeiras páginas, entretanto, têm o imprescindível intuito de informar quem, como, para que e até onde fariam a viagem ao Alto Purus. Trata-se de uma introdução ou prefácio anterior à narrativa, que se inicia em “A Viagem”.
A Revista da Academia Brasileira de Letras (ano 4, n. 12, p. 173-280), em abril de 1913, editou o Relatório sob o título Reconhecimento do Alto Purus com a correspondência e as atas, mas sem os mapas e quadros.
Julgamos que os mapas, atas e quadros são relevantes, sobretudo, para o entendimento do texto e por seu inegável valor histórico. Os mapas, principalmente, foram os principais instrumentos que possibilitaram acordos e convênios internacionais fixando definitivamente os contornos do território brasileiro. Os quadros, elaborados “sob a responsabilidade única do comissário brasileiro” (CUNHA, 1906, p. 88), informam, entre outros dados, nomes alternativos de lugares, pontos atingidos pelas comissões anteriores, permitindo ao leitor localizá-los no mapa, entendê-los e aquilatar o esforço da comissão brasileiro-peruana. Além disso, dados econômicos e populacionais presentes nos quadros permitem ao leitor julgar o valor do território em litígio na época.
O caráter empírico e documental do Relatório obriga seus autores a buscar objetividade, mas a tradução e, especificamente, a correspondência demonstram a dificuldade em alcançá-la na época do litígio entre brasileiros e peruanos.
Por falar em tradução, é digno de nota a ausência do texto em espanhol das edições posteriores a 1906. A fim de manter a transparência e evitar qualquer dúvida, os ministros do Brasil e do Peru enviaram as “instruções em quatro exemplares, cada um nos idiomas português e espanhol.” Para manter o mesmo intento, o Relatório seguiu, com exceção das notas e dos quadros do comissário brasileiro, o mesmo procedimento. Além de ser bilíngue, foi assinado pelos dois comissários. Diz Euclides na Observação às minutas do comissário peruano, de 9 de fevereiro de 1905:
Conforme sabem todos os membros de ambas as comissões, todo o Relatório foi feito por mim. À medida que o escrevia subordinava-o ao meu colega — passando-se depois a limpo as páginas em que acordávamos. Não houve divergências dignas de nota e o Sr. Comissário peruano bem pouco acrescentou ao que escrevi. Traduziu.
(apud TOCANTINS, 1978, p. 134)
De fato, o comissário peruano, Pedro Alejandro Buenaño, pouco acrescentou. Limitou-se, entre outros detalhes, a tentar disciplinar a pontuação e a sintaxe de Euclides e a modificar alguns trechos. Vale assinalar a supressão das aspas na citação de Emílio Goeldi e a indevida tradução de “caboclos” (mestiço de branco com índio ou antiga denominação do indígena) por “indios” (p. 72).
Nesta edição conservamos a pontuação original do autor e os grifos, bem como corrigimos e/ou atualizamos os nomes de pessoas e lugares dos textos em língua portuguesa. Seguindo os ditames dos mestres, elaboramos breves notas de esclarecimento “página a página” que, caso não fossem feitas, ocasionariam grande perda do valor e inteligibilidade do trabalho (cf. VENÂNCIO FILHO, 1940, p. 77).
Esperamos que os materiais relativos ao “Euclides amazônico” sejam reunidos e continuem a antologia Um paraíso perdido (CUNHA, 1976) ou sirvam de ensejo para a reunião dos textos integrais dos relatórios do Purus, da ilha dos Búzios e da Vitória, dos Fortes de Bertioga e dos dois da ponte de São José do Rio Pardo.
Agradecemos à bibliotecária do Instituto de Pesquisas Euclidianas Dr. Oswaldo Galotti, Srª Maria Cristina R. Sacchi e, postumamente, ao Dr. Oswaldo Galotti, proprietário do exemplar anotado de próprio punho, livro do qual nos servimos para o preparo da presente edição.
Juan Carlos
Referências bibliográficas
CUNHA, Euclides da. O Rio Purus. pref. de Leandro Tocantins. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960. 95 p. il.
CUNHA, Euclides da. O Rio Purus. In: Obra completa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1995. v. 1. p. 753-810.
CUNHA, Euclides da. Reconhecimento do Alto Purus. Revista da Academia Brasileira de Letras, Rio de Janeiro, ano 4, nº 12, pp. 173-280, abr. 1913.
CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião de ensaios amazônicos, com sel. e coord. de Hildon Rocha, introd. de Arthur Cezar Ferreira Reis. Petrópolis: Vozes, 1976. 327 p.
TOCANTINS, Leandro. Euclides da Cunha e o paraíso perdido: tentativa de interpretação de uma presença singular na Amazônia e a conseqüente evolução de um pensamento sobre a paisagem étnico-cultural, histórica e social brasileira, alargando-se nos horizontes da história transcontinental. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
VENÂNCIO FILHO, Francisco. A glória de Euclydes da Cunha. São Paulo: Nacional, 1940.