O Estado de S. Paulo, 4 de maio de 1897
I
Subordinado a este título recebemos o primeiro volume dos estudos realizados pelo sr. dr. Torquato Tapajós acerca das condições sanitárias da capital federal, determinadas pelos fatores preponderantes na gênesis e desenvolvimento das epidemias que periodicamente a assoberbam.Na impossibilidade completa de realizarmos a mais imperfeita síntese, consideramos apenas os aspectos predominantes do livro do nosso ilustre patrício.Definem-nos: o combate e subseqüente destruição de um erro resumido na afirmativa imponderada de um lençol d’água subterrâneo, no sentido higiênico da expressão, como fator de primeira ordem na constituição médica daquela cidade; a aproximação a suas condições meteorológicas da teoria notável de Jourdanet acerca da função fisiológica das pressões e, finalmente, o estudo realmente interessante da gênesis mórbida determinada pelas péssimas condições dos terrenos marginais em certas zonas da baía aliadas às feições topográficas que impedindo a ventilação franca dos alísios entrega-a ao império quase exclusivo das brisas alternantes.Em torno destas três questões capitais, emoldurando-as, surgem naturalmente outras, efluentes, expostas infelizmente, às vezes, com exagerado luxo de erudição.
Antes de abordar as teses principais referidas, porém, esboça o autor os grandes lineamentos do problema. Considera de um modo geral o meio ambiente e as suas reações permanentes sobre os organismos, atenuadas através do meio interior, segundo a concepção belíssima de Claude Bernard. E, após mostrar, a traços largos, como um corolário da própria aglomeração humana, a necessidade da vida artificial, definida pela modificação sistemática do meio exterior pelo homem, fixa o objetivo fundamental da higiene como ciência autônoma dentro de cujos limites “todas as raças se unificam, todos os climas se completam na harmonia de seus fatores, tendentes todos a manter pelo equilíbrio das funções internas dos seres organizados, as relações necessárias entre estes e o meio que os envolve”.
Realmente – ante um destino tão vasto compreende-se que não possa a higiene constituir-se como um aspecto particular apenas de uma ordem mais ampla de conhecimentos e sim erigir-se autônoma no círculo dilatado de indagações que requerem muitas vezes o concurso simultâneo da maioria das ciências.
Das relações mais gerais e simples às mais complexas – da geometria da forma e acidentes do solo à mecânica nem sempre simples das correntes aéreas e oceânicas; da ação persistente das leis astronômicas sobre a terra e desdobramento universal da vida à vasta série de leis físicas amplamente difundidas nos fenômenos meteorológicos; das análises do ar e das águas às oxidações e nitrificações da matéria organizada no solo traduzindo-se como uma função vital dos micro-organismos, e daí às indagações notáveis da biologia e destas ao desenvolvimento indefinido dos fatos sociais que se ligam gradativamente aos anteriores – expande-se essa ciência de inegável amplitude, caracterizada pela ligação íntima de grandes generalizações a sínteses brilhantes.
As três questões fundamentais a que nos referimos justificam de um modo frisante esta asserção.
Patenteiam, de fato, a universalidade de conhecimentos imanentes às indagações sobre a vida nas infinitas modalidades que lhe imprimem as ações complexas e nimiamente variáveis do meio exterior.
Consideremo-las, agora, rapidamente, a partir, segundo a própria marcha do autor, da lenda “científica” de um lençol d’água subterrâneo, ideado pelo engenheiro Revy, como principal fator da irrupção violenta das epidemias no Rio de Janeiro.
*
Revivendo o fácies primitivo das terras fluminenses no início da nossa existência histórica, com os documentos cedidos pelas crônicas dos velhos tempos, que não contrastam os cortes e sondagens geológicas atuais – verifica-se a existência de antigas lagoas e pântanos marginais, aterrados ulteriormente, pelas necessidades decorrentes da lenta expansão da cidade, a esmo quase, sem método, consoante aos interesses de momento, sem o trabalho preliminar de um esgotamento ou drenagem rudimentar sequer disfarçadas apenas hoje – velados por uma camada ligei[ra]mente consolidada de terras, sob a qual, numa espécie de decantação invertida, persistem as águas.
Cobertas apenas pelas terras, as lagoas interiores e mangues marginais, revestidos das vegetações maremáticas características, vieram assim, como que armazenados, intactos quase, aos nossos dias, graças ao equilíbrio de pronto estabelecido entre as perdas pela evaporação e o suprimento pela infiltração das chuvas naquelas, e nestes pelo contato permanente, através de camadas permeáveis com as águas da baía.
Ligando a estes dados fornecidos pela história os que resultam das observações atuais e ligando-as às manifestações externas do solo daquela cidade, no que é orientado pelos ensinamentos do eminente Belgrand, – acerca das relações estreitas entre a hidrologia e a constituição dos terrenos – conclui o dr. Tapajós, estabelecendo a natureza, de um modo geral impermeável do solo do Rio de Janeiro e a sua disposição de todo contraposta à existência de grandes coleções de água telúrica.
Resulta, assim, da reunião destes dados, um primeiro argumento antagonista à existência de um lençol de água contínuo e amplo, defluindo lentamente em íntima adesão aos poros de camadas permeáveis que embebe, oscilando periodicamente em grandes amplitudes e capaz de tornar aplicáveis àquela cidade as deduções resultantes das indagações memoráveis de Pettenkofer, sobre a marcha do cólera e da febre tifóide, em Munique.
De fato, assim considerando, as águas que aparecem em tais terrenos não comportam o regímen das grandes coleções dispostas em lençol, que sob a denominação cosmopolita proposta pelo ilustre Daubrée, derramam-se no seio [da] terra, às vezes, segundo tão dilatadas superfícies. Incluem-se antes nas águas “estagnantes” de Delhotel, águas isoladas, formando-se em terrenos acidentalmente permeáveis em pontos diferentes, produzindo através dos aterros a que ascendem por capilaridade, profusamente, o fenômeno da evaporação – erigindo-se assim como reservas permanentes da umidade tradicional do Rio de Janeiro.
A tais considerações adicionam-se, como argumentos de outra ordem, os próprios trabalhos do engenheiro Revy.
Deficientes e eivados de incorreções gravíssimas; calcados sobre sondagens em número relativamente insignificante e mal distribuídas, realizando-se precisamente nas zonas salpintadas outrora pelas lagoas e pântanos marginais, eles não facultam uma generalização fixando a disposição geológica do terreno.
Chegando além disto à conclusão – diametralmente oposta à realidade – de um solo impermeável e um subsolo permeável, o que indica uma observação imperfeita, e ligando, ao traçar as linhas de contorno do lençol idealizado, o nível deste às linhas superficiais do solo, o que indica o desconhecimento do próprio fenômeno geológico com que sonha, o engenheiro Revy é o primeiro a diminuir o valor dos próprios trabalhos.
Toda esta argumentação poderia entretanto revestir-se de maior altitude.
De fato, se remontando além dos velhos tempos memorados nas crônicas que deletreou, transpusesse o inclemente adversário do engenheiro Revy a nossa existência histórica, imperceptível ante a amplitude das idades da terra, numa pesquisa cuidadosa do gênesis do solo da cidade, mais decisiva acreditamo-lo, tornar-se-ia a sua argumentação.
Assim ser-lhe-ia fácil demonstrar que ele resulta da decomposição das rochas granítico-gnáissicas que definem a feição geognóstica da região: fenômeno complexo, cujos efeitos extraordinários aliados à lentidão com que se opera, só são conceptíveis através dos períodos geológicos, – iniciando-se geralmente ante as alternativas de calor e umidade por um desequilíbrio estrutural, e terminando pela ação simultaneamente mecânica e química das águas impregnadas de enérgicos reagentes.
Veríamos então que a argila resultante colorida pela decomposição do elemento plástico da rocha e o quartzo reduzido à areia, misturados e arrebatados pelas fortes enxurradas das chuvas tropicais, derivando velozmente pelas vertentes aprumadas iam formar no sopé da montanha, um solo inconsistente, de vasa.
A vegetação, cujo papel é tão amplo na economia geral da natureza, estendendo-se logo após, ao terreno que lhe era a pouco e pouco fornecido, consolidava-o, lenta e vigorosamente, prendendo-o pelos liames inumeráveis das raízes à rocha matriz – colaborando assim com os elementos nessa conquista admirável da terra sobre o mar.
Por outro lado, a resistência oferecida pela rocha à ação dissolvente da atmosfera, variando em diversos pontos, segundo a predominância de qualquer de seus elementos constituintes determina a decomposição mais rápida dos pontos fracos e o aparecimento de quebradas que se aprofundando cada vez mais, segundo as linhas de menor resistência, transformam-se muitas vezes em vales amplíssimos.
E assim, sobre um solo de aluvião veríamos despontar as colinas de contornos suaves e, emergentes nas águas da baía, as ilhas numerosas – afloramentos graníticos, restos esparsos de montanhas, formas evanescentes de antigos contra-fortes cindidos pelas águas…
Esta é inegavelmente a gênesis de todas as terras planas do litoral, formadas a custa dos materiais arrebatados à montanha adjacente. Ora, esta formação atumultuada, ante o assalto brutal dos elementos, não explica uma disposição regular em estratos contínuos, embora a diferença dos materiais dê lugar a uma estratificação distinta, determinada por séries de camadas sucedendo-se repetidas vezes, periodicamente, numa ordem regularíssima, de acordo com as modificações impressas pela alternativa das estações à quantidade e natureza dos depósitos sucessivos.
É vulgar nas formações sedimentárias tal disposição de materiais que, ainda mesmo quando tenham sido anteriormente confundidos na mesma torrente, separam-se mecanicamente no seio das águas tranquilas, depondo-se segundo a ordem das densidades sucessivas. Este último caso, porém, pressupõe condições que não existiam ao formar-se o solo do Rio de Janeiro.
O movimento incessante das vagas e a agitação periódica das marés de colaboração com a inconstância provável no regímen das águas meteóricas e o trabalho persistente da vegetação, obstaram naturalmente uma disposição em estratos regulares dos sedimentos argilosos. Na hipótese mais favorável, aquelas condições impedindo a distribuição uniforme de cada uma das camadas sobre vastas superfícies, poderiam dar aos sedimentos a disposição em diagonal das falsas estratificações, cruzando-se segundo planos irregulares, confundindo-se as mais das vezes os materiais depostos nos extremos das expansões lenticulares inerentes à formação. E, assim refletindo, vê-se que esta última formação explica por si mesma a existência dos limitados depósitos subterrâneos. De fato, as lagoas isoladas e os mangues soterrados que constituem hoje a base lacustre da cidade, resultaram naturalmente da forma lenticular dos mesmos estratos, cujos bordos extremos, como linhas irregulares de diques, represaram num ou noutro ponto as águas. Por outro lado, a mesma formação contrasta com a própria noção do lençol de água. Assim é que, em todas as regiões clássicas do fenômeno, a uma camada impermeável e contínua, superpõe-se invariavelmente uma outra, permeável, havendo entre elas uma linha nítida de separação, ondulada e independente de conformação exterior do solo. É o que se observa entre o flint de Munique e as camadas superpostas de areia e saibro através das quais fluem as águas subterrâneas, em direção quase perpendicular ao Izar, cujas enchentes, represando-as, originam oscilações de grande amplitude.
A gênese do solo do Rio de Janeiro é assim, até certo ponto, contraposta à existência de um vasto lençol d’água – que, além disto, segundo se depreende do exemplo que apresentamos, parece exigir para a sua definição exata, no sentido higiênico, a ocorrência de um rio de grandes enchentes periódicas e regulares.
De fato, caracterizada pelo estudo dos fenômenos químico-biológicos que realizam no seio das terras, segundo condições determinadas e fixas, sobre os corpos orgânicos, os micro-organismos – estes infatigáveis analistas da matéria –, a teoria de Pettenkofer, como é sabido, exige, a par das alternativas de nível citadas, de grandes amplitudes, longos períodos separando os movimentos de ascensão e descensão. Ora, somente as cheias periódicas dos grande rios, espaçadas pelo curso normal das estações, podem por conseqüência, satisfazê-la.
Assim reflexionando, vê-se quão insignificante é a influência das águas que embebendo terras de larga porosidade repousam no fundo das antigas bacias, ainda quando manifestassem tais oscilações – e não tivessem elas o nível fi[x]o constatado. Além destas considerações, conclui-se ante os próprios dados decorrentes das observações do engenheiro Revy que, admitido embora o lençol d’água idealizado, rodeado embora de todas as condições predisponentes à sua ação funesta, acha-se ele a tal profundidade que é inteiramente inócuo – ainda mesmo, fazendo-se ao mesmo engenheiro a concessão nova de admitir que a camada impermeável, por ele observada no solo, deixe passar, por infiltração, os detritos destinados às fermentações prejudiciais.
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São estas as conclusões gerais a que chega o dr. Tapajós na primeira parte do seu livro.
Atinge-as, porém, por um longo caminho, revestindo o assunto de uma erudição luxuosa e dando-nos pelo constante apelar a grandes notabilidades, a ideia de quem não se sente seguro ao enfrentar o árduo problema.
A questão principal não raro é lançada a um segundo plano, ficando em relevo considerações relativamente insignificantes, de modo que o assunto encarado por inúmeras faces e entretecido de injustificáveis questões de detalhe, perde em vigor o que ganha em prolixidade.
As citações acumulam-se, persistentes, indicando até certo ponto uma assimilação imperfeita e despindo o conjunto trabalhado da nota pessoal – única capaz de imprimir-lhe um indispensável caráter de unidade.
Entretanto, os trabalhos desta ordem, naturalmente complexos, erigem-se sempre sintéticos, repelindo notavelmente a distensão, a inconsistência e a descontinuidade derivada de longos e sucessivos empréstimos aos mais variados autores. Os ensinamentos promanados das mais diversas fontes – unificados através de um temperamento e fundidos num só estilo – podem muitas vezes revestir-se de uma feição original, ligados de um novo modo, subordinados a um outro método à luz do qual muitas vezes conduzem a novas deduções.
Nem é outra a originalidade da maioria dos livros de ciência, na altitude atual do pensamento humano em que é tão difícil o descobrimento de uma verdade nova.
É que os materiais estranhos fornecidos combinam-se neles de tal modo numa síntese inteiriça e tão perfeita, às vezes, que se torna dificílimo discriminar, no aspecto geral do trabalho, o que pertence a cada um dos mestres consultados.
Estes livros distinguem-se, portanto, ao primeiro lance de vista, dos que se erigem como uma mistura de excertos, acumulação mecânica de citações e fragmentos…
Lamentamos que seja este o principal defeito revelado logo na parte considerada, de um livro em que se averbam observações notáveis e que lemos com uma atenção religiosa de discípulo.
Longos e sucessivos empréstimos tornaram-no grande demais, multiplicando-lhe as páginas, para enquadrar perfeitamente o assunto, o que, certo, não aconteceria se o sr. dr. Tapajós, aproveitando-se dos ensinamentos dos mestres prediletos, não lhes pedisse, a todo instante, o próprio estilo.
Daí os defeitos apontados, a que se aliam outros igualmente sérios. Assim é que a sucessão das citações é tão vertiginosa às vezes, que a falta das aspas consagradas não nos permite saber aonde termina a colaboração do cientista estranho e recomeça a responsabilidade literária do autor.
Felizmente, destacando-se nitidamente através de um estilo que mal conseguimos destramar no emaranhado das transcrições, avultam, evidenciando-se por si mesmas, autônomas, a frase correta e brilhante de Daubrée, por exemplo, ou os períodos sonoros e inimitáveis de um grande poeta, por acaso entregue a indagações geográficas – Elysée Réclus.
Não insistamos, porém, neste assunto.
Euclides da Cunha
O ESTADO DE SÃO PAULO
São Paulo, 9 de maio de 1897
II
Dos fatos observados por Jourdanet nas altas cordilheiras do México e das experiências de Paul Bert, resulta que o decrescimento da pressão atua como um agente asfixiante sobre o conjunto geral da vida, acarretando, por uma hematose imperfeita, um lento esgotamento de energia e alto grau correlativo de receptividade mórbida.
O habitante das regiões elevadas, dos altos planaltos ou das altas montanhas está, assim, naturalmente, destinado a uma existência reduzida e incompleta – conseqüência de uma oxidação imperfeita dos elementos orgânicos.
A anoxiemia barométrica – espécie de mal das montanhas crônico na frase expressiva de Bordier, endêmica sobre todas as altitudes, erige-se deste modo como a causa predisponente, persistente e insanável da maioria dos males, preparando à expansão violenta das moléstias organismos combalidos e adinâmicos.
Após a exposição destes estudos notáveis acerca do valor fisiológico das pressões nas quais a tensão do oxigênio diminui na razão direta das quedas barométricas definidoras das grandes altitudes, considera o dr. Tapajós as experiências de Lombard pelas quais se verificam variações da mesma tensão segundo as condições térmicas do ambiente.
Ante os quadros organizados por este último experimentador, registra as modificações impressas à respiração pelo calor – determinando por várias temperaturas médias o déficit de oxigênio correspondente, relativamente à quantidade existente no ar a 0° e a 0m sobre o mar. Estabelece depois as relações inversas entre as altitudes e o grau das pressões, registrando as modificações impostas à mesma função pela pressão – determinando para diversas altitudes o mesmo déficit, segando as mesmas condições.
Aproximando então as duas séries de experiências, observa-se um paralelismo perfeito entre os acréscimos de temperatura e sucessivos acréscimos de altitude, relativamente à tensão do oxigênio do ar. “É assim que se pode comparar o ar a 0m e a 10º com o ar a 321,0m e a 0º. Encontra-se também quantidades equivalentes a 655,0m e a 0º e a 0m e a 25º.”
Conclui-se deste modo, logicamente, pela possibilidade de substituir-se, de acordo com as circunstâncias exteriores, as condições topográficas pelas condições térmicas, visto como podem manifestar idênticos efeitos gerais, efluentes de um idêntico estado barométrico, – uma localidade marítima com uma alta temperatura média e uma cidade de montanha com uma temperatura inferior.
Esta conclusão teórica, perfeitamente aceitável exige, porém, inúmeras cautelas na sua aplicação à climatologia. Realmente, desde que, seguindo paralelamente a definição de Humboldt, compreendamos que o clima, de um modo geral, tem uma significação altamente complexa, abrangendo todas as modificações da atmosfera que dependem simultaneamente da temperatura, da umidade, do estado barométrico, da tranquilidade do ar, do grau da tensão elétrica, etc., até da própria serenidade do céu de que se deriva um conjunto de sensações morais características de diversas zonas – desde que assim compreendamos vemos claramente, em virtude da reação inevitável destes fatores uns sobre outros, o perigo das deduções teóricas realizadas como no caso atual, pela apreciação isolada de cada um deles.
Os argumentos subsequentes do dr. Tapajós exemplificam esta asserção. Assim é que, ante os resultados daquelas experiências, chega ele a concluir que, sob o aspecto particular de seu estado barométrico normal, perde o Rio de Janeiro a feição de cidade marítima com uma temperatura média anual de 25º, apresentando-se a sua atmosfera pela tensão do oxigênio que contém, em condições idênticas à de uma cidade ereta a 650,0m sob a temperatura média de 0º centígrados.
E prossegue: “A 0m como tomamos a cidade do Rio de Janeiro e com uma temperatura de 30º que não é exagerada para o verão, o ar que respiramos contém 0,26928 de oxigênio que corresponde à passagem pelo pulmão em 24 horas de 4.039 gramas. Isto, porém, nas condições normais de pressão a 760m.
Se agora esta pressão for tomada como se nos apresenta correspondendo a uma altitude de 650,0m a 700,0m, que lhe é marcada pela temperatura média anual de 25º que a 0m lhe dá o mesmo volume de oxigênio que a 0º e a 654m o teria, verificamos que a quantidade de oxigênio contida num litro de ar àquela altitude e à temperatura de 25º é de 0,2525 ou, para 15.000 litros, de 3.781 gramas o que dá em resultado um déficit de 702 gramas em 24 horas.”
Daí, deste imenso déficit do pabulum vitae, a perturbação do meio biológico, a explicação da anoxiemia barométrica no Rio de Janeiro.
Ora, os raciocínios aduzidos afiguram-se-nos exagerados.
Realmente, em virtude das marchas inversas do barômetro e do termômetro, foi, como vimos, o Rio de Janeiro, por uma ficção claramente justificada, assemelhado a uma cidade erguida a algumas centenas de metros sobre o mar – isto é – a tensão do oxigênio em sua atmosfera de cidade marítima sob 25º, é igual a existente na de uma localidade a 645,0m e a 0º.
Quer isto dizer, evidentemente, que somente em virtude daquela alta temperatura foi a cidade marítima idealmente deslocada para as alturas, assumindo todos os característicos de uma cidade de montanha, sob um ambiente rarefeito. Compreende-se portanto que na concepção existem implicitamente os efeitos resultantes daquele elevado estado térmico modificador da pressão, de sorte que considerá-lo novamente, adicionando ao seu influxo o de uma pressão correspondente àquela altura, equivale a transmudar a ficção em realidade, equivale, de algum modo, a supor que realmente está o Rio de Janeiro àquela altura sobre o mar.
Daí o grande déficit encontrado.
Além disto, admitida a realidade de tais deduções, vemos que são calcadas sobre elementos que só poderão existir durante muito pouco tempo, no verão, ao passo que a teoria de Jourdanet, de efeitos lentos e seguros, exige uma certa constância nas condições funestas que os originam, a persistência inalterável da ação deprimente de um certo meio, – sem largos períodos de repouso durante os quais possa o organismo largamente refazer-se.
Estes elementos excepcionais e aquela argumentação torturada, revelam a intenção anti-filosófica de subordinar a realidade às tendências teóricas, os materiais objetivos às fantasias subjetivas. É notável, entretanto, que procurando, através dessa inversão de um princípio geral, acomodar a realidade à uma ideia preconcebida, abandonasse o distinto engenheiro um elemento que lhe era favorável – o estado higrométrico do ar. Diz que “a presença ou ausência da umidade em nada modifica a insuficiência de oxigênio do ar dilatado pelo calor; o que dá em resultado o fato de sob a influência de uma atmosfera quente e carregada, de umidade produzir-se a mesma aceleração de movimentos respiratórios e batimentos de coração que se dá em pessoas mergulhadas em uma atmosfera quente e seca.” Ora, esta afirmativa contrasta com idéias correntes na ciência.
A aceleração dos movimentos respiratórios, o coração estoante, a prostração geral, devem ser mais acentuadas num ambiente cálido e úmido porque, segundo o dizer de meteorologista notável, “o vapor aquoso tem o efeito de uma diluição ou rarefação do ar”. Segundo observa o professor Frederico Draenert no seu notável “Estudo sobre o clima do Brasil”, o dr. Ueke calculou que no clima tropical e úmido de Madraste um homem inala normalmente 80,7 quilogramas de oxigênio por mês, em Bruxelas ou Londres, porém, 87,3 e em S. Petersburgo 90,4.
À proporção que aumentam os graus de latitude e se abaixam conseqüentemente os pontos de saturação do ar, cresce a absorção daquele elemento, que atinge um máximo no clima seco da capital da Rússia; em diminuto grau embora, a quantidade de água do ar alia-se, assim, à temperatura e à pressão para a diminuição do elemento ativo da atmosfera.
Mas ainda quando fizéssemos intervir este fator, a interpretação judiciosa dos estudos de Lombard somente pode demonstrar que o Rio de Janeiro tem, quase, as condições barométricas de uma situação alpestre pouco elevada.
E neste caso, ao invés de caracterizar-se por um clima deprimente, entra na categoria das cidades onde, segundo observa Arnould, a tendência para diminuir o oxigênio contido no sangue, compensada pela rapidez da corrente circulatória e pela amplitude da respiração, terá o valor de estimular certas partes preguiçosas do pulmão que nas condições normais são indiferentes à expansão respiratória.
Segundo ainda observou P. Bert, sob o influxo de uma pequena depressão, resultante de altitudes que não vão além de 1.500 metros, diminui o ácido carbono no sangue na proporção de 3 volumes por 40. Deste último caso resulta conforme observa Arnould que “como há menos ácido carbônico para saturar as bases do sangue estas podem mais vantajosamente neutralizar o ácido láctico resultante do funcionamento dos sistemas muscular e nervoso, ácido que, como é sabido, é um agente prejudicial à integridade das funções orgânicas.”
Talvez, acrescenta o eminente higienista, a alacridade dos montanheses e a disposição para as marchas dos viajantes nas montanhas pouco elevadas tenham uma explicação naquele fato.
Em contraposição às deduções do distinto engenheiro podemos, portanto, acreditar que o Rio de Janeiro com uma ligeira diminuição de tensão do oxigênio, determinada por uma temperatura média anual de 22,7º, não tem o meio excepcional de Puebla, campo das observações de Jourdanet, aonde uma atmosfera rarefeita impõe um coeficiente de redução mais ou menos variável, às existências.
E se fossem verdadeiras aquelas deduções poderíamos demarcar à nossa nacionalidade um destino lamentável.
Realmente, dando-se ao planalto central do Brasil a altitude média de 700 ou mesmo de 600 metros e considerando que a maior parte da sua superfície é abrangida pela larga faixa determinada pelos isotermos de +20º e +25º – se, compondo os efeitos resultantes daquela altitude e da temperatura média geral sobre a depressão barométrica, argumentássemos seguindo o traço deixado pelos raciocínios aduzidos pelo sr. dr. Tapajós, concluiríamos que a porção mais rica e mais interessante da nossa terra, – planalto amplíssimo destinado a ser o palco de uma civilização maravilhosa – estaria destinado a uma população de anoxiêmicos frágeis e deprimidos.
Os haustos ardentíssimos e violentos do NO, resvalando pelos planos inclinados das chapadas e determinando as bruscas oscilações do barômetro; o afastamento da costa – da grande influência moderadora do mar – originando a instabilidade dos climas continentais e as variações termométricas de grandes amplitudes, aliar-se-iam àqueles fatores nefastos agravando-lhes os efeitos.
A luta pela vida em tal meio seria uma coisa ilógica e de aspectos paradoxais. Não se erigiria como uma causa de aperfeiçoamento, pela seleção de qualidades eminentes – traduzir-se-ia pela degenerescência, como meio mais natural de adaptação. Os mais fracos seriam os mais fortes. Os casos patológicos dos outros países, como a anemia, traduzir-se-iam como fenômenos fisiológicos e esmagados pelo meio, num completo aniquilamento intelectual e físico, depereceríamos lentamente sob a ação incoercível de males insanáveis.
Podemos afastar, porém, esta perspectiva dolorosa, resultante de deduções teóricas, expostas brilhantemente, mas imperfeitas para a definição exata de um clima qualquer. Além disto, dificilmente e somente em casos mui simples, pode-se adaptar a fixidez dos números resultantes de experiências a infinita variabilidade dos fenômenos vitais.
Consideremos, agora, a última parte do interessante trabalho que lemos, aonde através de observações criteriosas surgem as causas reais do péssimo estado sanitário do Rio de Janeiro.
Euclides da Cunha
O ESTADO DE SÃO PAULO
São Paulo, 14 de maio de 1897
III
Ora o trecho de nosso litoral em que se abre a baía do Rio de Janeiro afigura-se-nos admiravelmente apropriado à formação destas correntes perturbadoras.
De fato, correndo a costa naquele ponto segundo a orientação geral de E a O e portanto paralelamente ao Equador – paralelamente ao traço médio sobre a terra da marcha aparente do sol – esta disposição, por isto mesmo, facilita de muito, evidentemente, a alternância distinta das brisas, do terral e da viração, acentuando com o máximo rigor as desigualdades térmicas que as ocasionam.
Soprando perpendicularmente à costa, combinam-se aquelas com o NE que é quase o vento constante do mar largo na latitude do Rio, determinando segundo as resultantes geométricas correspondentes, os ventos dominantes de SSE e NNW, conforme preponderam, de acordo com as estações, as brisas do mar ou as de terra.
Numa escala extraordinariamente reduzida, realiza-se, deste modo naquele fragmento do nosso litoral, fenômeno semelhante ao que se observa no golfo de Guiné, nas terras do Dahomey e da Libéria, aonde a corrente normal dos alísios vigorosamente atraída para as regiões adustas do Sudão, dobra-se para nordeste, formando um ângulo reto com a direção anterior, precipitando-se para o Saara cuja atmosfera dilatada aspira-a fortemente.
No Rio de Janeiro portanto a ventilação tonificadora do mar somente, pode ser originada, de um modo geral, pelo SSE.
É a linha mediana fixa, constante, excepcionalmente desviada – apenas quando o impulso violento dos ventos do sul avança até as nossas plagas, fixando no tumulto espantoso das forças que se desdobram nas camadas aéreas uma componente prodigiosa – o pampeiro.
São casos estes, porém, isolados e inaptos para destruírem a feição meteorológica que estatuímos.
Ora – assim sendo, as antemurais altíssimas das montanhas que circunscrevem a cidade tornam imperfeitíssima a ação direta daqueles ventos carregados de ozona, purificados pela longa travessia dos mares.
A simples inspeção de uma carta geográfica mostra-nos ainda, além disto, que irrompendo pela entrada estreita da barra, os ventos de SSE não caem diretamente sobre a cidade.
Embora aquela direção coincida com o eixo médio da entrada, a constrição brusca imposta às ondas aéreas dilatadas quebra-lhes a continuidade anterior e elas invadem o largo âmbito da baía, redemoinhando, longamente perturbadas pelas correntes secundárias em que se diferenciam entorpecidas pelas contra-correntes derivadas, indefinidas, como um enorme extravasamento aéreo, sem a propulsão contínua característica.
*
O Rio de Janeiro está consequentemente fora da grande influência climatológica dos ventos regulares que pela direção geral de SSE, e não de SE como escreve o dr. T. Tapajós, atingem-no indiretamente, por intermédio de correntes secundárias indefinidas.
Está sob o regímen quase exclusivo das brisas alternantes oriundas das modalidades térmicas locais – e, adstrito à imperfeita renovação atmosférica pela circulação vertical incompleta e agindo isoladamente às vezes, constitui, numa latitude francamente batida pelos ventos do mar largo, um meio excepcional do qual se deriva a maior parte dos males.
Foi esta a primeira conclusão geral a que chegou o dr. Torquato Tapajós no estabelecimento das causas predominantes da insalubridade do Rio de Janeiro. E ao atingi-la e ao desdobrá-la subsequentemente – apesar de avultarem os defeitos que ousamos apontar no início desta pálida apreciação – num acumular excessivo de transcrições em grande parte dispensáveis – é forçoso convir que a questão é estabelecida de um modo perfeitamente claro e brilhantemente explanada.
Acompanhemo-la rapidamente.
Entregue ao domínio quase exclusivo das brisas de terra e do mar, a cidade, subordinada a uma ventilação local, subordina-se a todos os inconvenientes dela resultantes.
O assunto é desenvolvido de um modo claríssimo.
Da mesma forma que a atmosfera, as águas da baía, a partir de uma linha ao norte da ilha das Cobras, eximem-se, a pouco e pouco, da influência regeneradora das correntes do mar largo – de sorte que mais para o fundo, a partir das ilhas do Governador e Paquetá, manifestam a placidez do imenso lago pouco profundo, em cuja superfície tranquila mal se revela o movimento alternativo das marés.
As correntes da vazante ou da enchente não as impressionam. Permanecem em depósito, estagnadas; não se renovam.
“É assim que por depósitos sucessivos e feitos desde longas épocas, sob a tranqüilidade aparente desta superfície líquida sem espessura encontra-se, formando o fundo da baía, camadas espessas de lama apodrecida que se generalizam por todo o contorno submerso. A primeira camada deste fundo de cima para baixo é de vasa muito fluida com 5,9m de espessura, seguindo-se outra de 1,50m também de vasa e da qual se desprende ácido sulfídrico, encontrando-se nesta detritos animais e vegetais de várias espécies.”
Ora, é precisamente em derredor deste trecho, rendilhando-o circularmente, que deságuam os rios derivando pelos pendores das montanhas adjacentes, fornecendo pelo número senão pelo volume próprio um novel suprimento de água doce, e acarretando das nascentes grande cópia de materiais destinados à fermentação.
Estas correntes fluviais, misturando-se às águas salgadas e impuras, determinam a formação de pântanos mistos, profusamente disseminados pelo litoral e nos quais a confusão de dois meios biológicos distintos favorece muitíssimo a evolução dos micróbios da fermentação, criando, segundo a observação judiciosa de Laverau, um meio particularmente favorável ao aparecimento dos miasmas palustres.
Assim – considerando-se o número elevado de rios e pequenos cursos d’água que num segmento diminuto daquela parte do litoral, pouco afastado uns dos outros, deságuam, originando o vastíssimo banco de detritos a que nos referimos – assume aquela parte da baía a feição perfeitamente acentuada de um delta – idêntico pela origem e pela disposição geral aos que se constituem, à foz dos grandes rios.
Daí, desta identificação racionalíssima uma função idêntica a daquelas grandes formações aluviais: o aparecimento de um meio nimiamente próprio aos desdobramentos, às reações químicas inevitáveis entre a matéria orgânica e os sulfatos dissolvidos nas águas do mar, derramando-se os produtos voláteis da decomposição – emissários latentes da febre – pela atmosfera que corrompem, comunicando-lhe propriedades mefíticas.
Da foz do Irajá à do Merity, seguindo um curso circular de O para E, à do Magé ou Suinhy – revestidas da flora maremática característica, confundidas, entrelaçadas às vezes pelas anastomoses que sulcam os terrenos inconsistentes intermediários, espalham-se em vastos plainos as largas marais sobre as quais com uma regularidade assustadora, passam, absorvendo-lhes os eflúvios funestos, as brisas de terra que se dirigem para a cidade. Livres do influxo rigoroso dos ventos regulares, elas seguem rumos definidos e entre limites fixos, de acordo com a disposição imutável das terras e das águas. Soprando a princípio de NO e descambando lentamente para N e para NE, percorrem precisamente a curva circular segundo a qual se desdobram as formações maremáticas citadas.
“É por este modo que os densos vapores que se produzem nos pântanos de Magé, do Guapy, do Macacú e de outros rios, acumulam-se prenhes de infecção e vêm conduzidos pelos ventos derramar-se sobre a cidade numa prodigalidade esmagadora.”
Avançando em direção quase normal às montanhas – que assim como impedem o afluxo salutar e vivificantes dos alísios, impedem o afastamento destas correntes funestas – esbatem-se nelas, pairam algum tempo sobre a cidade, sobre a qual depois descem, lentamente, pelas encostas, quando pela irradiação noturna o resfriamento mais rápido das assomadas origina a corrente descendente das brisas das montanhas.
Daí a formação da mais larga base da insalubridade do Rio de Janeiro – a persistência do elemento palustre como fundo generalizado de grande número de moléstias “lastro de todos os nossos males”, segundo a expressão feliz do autor.
Como argumento frisante, prova irrefragável desta asserção, considera diversos pontos da baía relativamente à direção dos ventos.
A inocuidade da brisa NO, caindo sobre a cidade depois de filtrada pelas matas da ilha do Governador, é inega[ve]lmente um argumento expressivo e uma observação interessantíssima. Encontrando aquela ilha, as correntes aéreas, impregnadas de miasmas, depõem-nos em sua face setentrional, fronteira à região pantanosa, e emergem ao sul, demandando a cidade, puríssimas, fortemente oxigenadas.
A ilha do Governador – cuja função providencial exercida sobre o Rio de Janeiro é, assim, limpidamente demonstrada, divide-se deste modo em duas zonas radicalmente diversas, dois climas absolutamente diferentes – a dois passos um do outro –, a salubridade notória da sua borda meridional contrapondo-se à insalubridade da que recebe o primeiro bafejo dos ventos.
Ao caírem para N e NE, as brisas deixam de passar pela ilha, trazendo até a cidade os elementos deletérios.
O confronto entre os hospitais de S. Sebastião e Jurujuba é por sua vez eloquentíssimo.
O primeiro revestido de melhores condições técnicas, de harmonia com o seu destino, tem uma cifra de mortalidade sensivelmente mais elevada do que o último – sendo, entretanto, este, destinado em geral a enfermos de procedência marítima aos quais faltam quase sempre os primeiros cuidados.
É que sobre aquele incidem diretamente as brisas locais, após varrerem os vastos pantanais de Inhaúma e o último no recôncavo abrigado que o isola dos ventos da baía, recebe, melhor do que a cidade, o influxo tonificador dos ventos gerais que sopram a oeste.
– Baseando nas causas apontadas a gênesis da maioria dos males que assolam a capital da República o sr. dr. T. Tapajós, aduz – através de um interview persistente, contínuo e infatigável com as competências provadas do assunto, – segundo o processo que infelizmente adota em todo o livro – raciocínios tendentes a demonstrar, após longas considerações, que os numerosos casos violentos de acesso pernicioso na capital federal se filiam à intoxicação palustre – dominadora quase exclusiva da patologia daquela cidade. Todo o mal provém do paludismo, proteiforme, mercê das inúmeras complicações com outras espécies endêmicas e epidêmicas, graças à sua afinidade notável para as diversas moléstias. E esse mal é antigo – contribuindo para o seu recrudescimento antes o desaparecimento de antigas e vastas culturas que outrora animavam e saneavam os lugares entregues hoje à expansões espontâneas das vegetações maremáticas, do que, segundo uma opinião corrente, a destruição das matas circunjacentes – fator climatológico de última ordem – ante as grandes causas gerais explanadas.
O caráter manifestado pelas febres, pode-se ser modificado paralelamente ao aumento da população, ao desenvolvimento industrial, à modificação dos costumes, à frequência incalculavelmente maior de navios na baía – vasto laboratório de males – à intrusão repentina do elemento estrangeiro em alta dose, não aclimado – ao acréscimo, em suma, das exigências imperiosas decorrentes da vida artificial complexa de uma grande cidade, – as causas gerais, porém, persistem, as mesmas, inalteráveis.
Atinge-se neste ponto a última página do livro.
Euclides da Cunha
CUNHA, Euclides da. Estudos de higiene. EUCLIDESITE. Obras de Euclides da Cunha. Prefácios e críticas. São Paulo, 2020. Disponível em: https://euclidesite.com.br/obras-de-euclides/prefacios-e-criticas/. Acesso em: [data]. Artigos publicado originalmente n’ O Estado de S. Paulo, em 4, 9 e 14 maio 1897. Reprod. CUNHA, Euclides da. Outros contrastes e confrontos. In: Obra completa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2009. v. 1. pp. 520-536. Crítica ao livro: TAPAJÓS, Torquato Xavier Monteiro. Estudos de higiene: a cidade do Rio de Janeiro – terras, águas e ares: ideias finais. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1895. v. 1. xv, 288 p. Segundo Sacramento Blake, Dicionário bibliográfico brasileiro, v. 7, p. 317, os dois outros volumes propostos para este trabalho não foram publicados.